A sombra: uma psicologia do mal

Queremos ser otimistas em relação ao nosso mundo e ver a beleza. É-nos difícil constatar a presença histórica do mal. Essa incapacidade de reconhecer as manifestações da sombra coletiva na sociedade torna-nos ingénuos e vulneráveis à influência das forças corrosivas do mal.

A sombra coletiva pode tomar a forma de fenómenos de massa, pelos quais nações inteiras são possuídas pela força arquetípica do mal. Isso pode significar que as pessoas se identificam com uma ideologia ou com um líder que expressa os medos, frustrações e fraquezas de toda a sociedade.

Com frequência, essa identificação toma a forma, a nível coletivo, de fascinações fanáticas, tais como perseguições religiosas, intolerância racial, sistemas de castas, busca de bodes expiatórios, caça às bruxas ou ódio genocida.

Quando uma minoria carrega a projeção de tudo aquilo que a sociedade rejeita, o potencial para o mal é ativado. Exemplos desse fenómenos de massa, na nossa época, incluem os pogroms czaristas na Rússia da viragem do século, a perseguição nazi aos judeus e ciganos no holocausto da Segunda Guerra Mundial, o anticomunismo e o macarthismo nos Estados Unidos nos anos 50, o sistema constitucional do apartheid na África do Sul.

A nossa época testemunhou essas e outras psicoses de massa que se traduziram em atos de crueldade e de selvajaria inimagináveis.

O mal coletivo desafia a compreensão. Essas forças erguem-se da mente inconsciente de um grande número de pessoas,geralmente intoxicadas por uma propaganda virulenta. Quando ocorrem essas epidemias mentais, ficamos geralmente impotentes para combater os flagelos que as acompanham. As poucas pessoas que não se deixam arrastar por essas ondas hipnóticas tornam-se facilmente vítimas.

Basta lembrar que o povo alemão negava a existência dos campos de extermínio nazis, que o mundo ficou cego diante do regime genocida dos Khmers Vermelhos no Camboja, que negligenciou a situação crítica do Tibete às mãos da China comunista e não soube intervir a tempo de evitar o genocídio no Ruanda.

Se realmente quisermos enfrentar o desafio do mal no mundo, cada um de nós precisa de assumir a sua responsabilidade em termos individuais. Precisamos de o admitir e reconhecer como parte de nós mesmos, para adquirirmos um maior grau de consciência, e para não nos deixarmos arrastar por fenómenos coletivos de consequências nefastas.

Ao encontro da Sombra
Connie Zweig, Jeremiah Abrams (orgs)
Editora Cultrix, São Paulo

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